Por: Rodrigo Haidar
Ao aprovar a Lei da Ficha Limpa, o legislador buscou proteger a probidade administrativa, a moralidade para o exercício do mandato e a normalidade e legitimidade das eleições. Quando estabeleceu novas hipóteses de inelegibilidade, a Lei Complementar 135/10 apenas cumpriu comando previsto na Constituição, que fixou a obrigação de considerar a vida pregressa dos candidatos para que se permita ou não a sua candidatura.
Essas são algumas das observações do presidente do Tribunal Superior Eleitoral e ministro do Supremo Tribunal Federal, Ricardo Lewandowski, em seu voto de 36 páginas, nas quais defende que a Lei da Ficha Limpa se aplica já para as eleições de 2010 e deve surtir efeitos sobre candidatos condenados ou que renunciaram para escapar da cassação, mesmo antes de as novas regras entrarem em vigor.
Logo no início do voto que proferiu no julgamento do ex-candidato ao governo do Distrito Federal, Joaquim Roriz (PSC), na última quinta-feira (23/9), o ministro ressaltou que a Lei da Ficha Limpa é amparada pelo parágrafo 9º do artigo 14 da Constituição, que, segundo ele, “integra e complementa o rol de direitos e garantias fundamentais”.
A regra fixa o seguinte: “lei complementar estabelecerá outros casos de inelegibilidade e os prazos de sua cessação, a fim de proteger a probidade administrativa, a moralidade para exercício de mandato considerada vida pregressa do candidato, e a normalidade e legitimidade das eleições contra a influência do poder econômico ou o abuso do exercício de função, cargo ou emprego na administração direta ou indireta”.
Esse é um dos motivos que, para Lewandowski, justificam que a lei seja prestigiada e tenha aplicação imediata. Outro motivo, de acordo com o ministro, é o fato de que a lei não deforma o processo eleitoral. Por isso, não é preciso aguardar o prazo de carência de um ano previsto na Constituição para que a Lei da Ficha Limpa tenha plena eficácia.
O presidente do TSE ressaltou que só se pode falar em afronta ao princípio constitucional da anterioridade quando ocorrer: “I) o rompimento da igualdade de participação dos partidos políticos e dos respectivos candidatos no processo eleitoral; II) a criação de deformação que afete a normalidade das eleições; III) a introdução de fator de perturbação do pleito, ou IV) a promoção de alteração motivada por propósito casuístico”.
Como a Lei Complementar 135/10 é linear e se aplica a todos indistintamente, não há deformação. “Não há o rompimento da igualdade das condições de disputa entre os contendores, ocorrendo, simplesmente, o surgimento de novo regramento normativo, de caráter linear, ou seja, de disciplina legal que atinge igualmente todos os aspirantes a cargos eletivos”, afirmou Lewandowski.
Para o ministro, só haveria desequilíbrio se a nova lei prestigiasse determinada candidatura, partido político ou coligação em detrimento dos demais. Isso porque o processo eleitoral é integrado por normas que regulam as condições em que se trava o pleito, não se incluindo entre elas os critérios de definição daqueles que podem ou não apresentar candidaturas.
“Não se contesta que a modificação das regras relativas às condições regedoras da disputa eleitoral, aprovada no ano em que ocorre o pleito, poderia dar azo à uma eventual quebra da isonomia entre os candidatos. Tal não ocorre, todavia, com a alteração das normas que definem os requisitos para o registro de candidaturas. Neste caso, elas direcionam-se a todas as candidaturas, sem fazer distinção entre os vários postulantes, motivo pelo qual não têm o condão de afetar a igualdade que deve reger a disputa eleitoral”, registrou o presidente do TSE.
O ministro Lewandowski também reforçou que se a lei complementar que dispõe sobre inelegibilidades entrou em vigor antes de 5 de julho, prazo final para o registro das candidaturas, pode ser aplicada às eleições do mesmo ano.
De acordo com o ministro, o fundamento que justifica a aplicação da lei para os casos de quem foi condenado antes dela é simples: “Por ocasião do registro, considerada a lei vigente naquele momento, é que são aferidas as condições de elegibilidade e as causas de inelegibilidade”. Por isso, “não se trata de hipótese de retroatividade”.
Ricardo Lewandowski ainda frisou que as normas que alteram ou impõem inelegibilidades não têm caráter penal, como também não configuram sanção. Constituem regras de proteção à coletividade, que estabelecem preceitos mínimos para o registro de candidaturas, tendo em mira a preservação dos valores republicanos. Esse é mais um motivo que, na concepção do ministro, afasta o argumento de que a lei retroage para prejudicar candidatos.
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