O ministro Gilson Dipp, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), advertiu que a utilização indiscriminada do habeas corpus, em substituição a outros mecanismos processuais, pode levar à “desmoralização do sistema ordinário” e até mesmo comprometer a principal missão constitucional da Corte, que é a uniformização da jurisprudência sobre leis federais – construída, sobretudo, no julgamento dos recursos especiais.
Previsto entre as garantias fundamentais da Constituição, o habeas corpus é usado em defesa da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação em sua liberdade de ir e vir, por ilegalidade ou abuso de poder. No entanto, segundo o ministro, esse instituto constitucional vem sendo transformado “em remédio para qualquer irresignação, no mais das vezes muito longe de qualquer alegação de violência ou coação contra a liberdade de locomoção”.
Ele sugeriu que, ante a “exuberância de impetrações”, o STJ considere com mais rigor o uso do habeas corpus, por meio da jurisprudência e ao menos no âmbito de sua jurisdição, “de modo a admitir tão só os pedidos cujo tema já tivesse sido objeto de exame pelas instâncias ordinárias, ou quando devida e oportunamente prequestionados”. Na opinião do ministro, “proteger os limites do habeas corpus é fazer respeitar sua credibilidade e funcionalidade”.
Gilson Dipp fez essas considerações ao julgar, como relator, mais um dos inúmeros pedidos de habeas corpus que se avolumam no STJ. Dessa vez, a ordem havia sido impetrada em favor de Lucio Ruedas Busto, ligado ao narcotráfico internacional controlado pelo Cartel de Juarez, do México, e que foi preso e condenado por lavagem de dinheiro e naturalização falsa no Brasil – onde usava o nome de Ernesto Plascencia San Vicente.
Cidadão mexicano, acusado de trazer ao país e aplicar US$ 3 milhões de origem ilícita, o réu foi condenado em Curitiba (PR) e, após apelação, teve a pena fixada em sete anos e seis meses de reclusão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Além de um recurso especial que tramita no STJ, sua defesa impetrou habeas corpus para trancar a ação penal ou anular o processo. O pedido foi rejeitado de forma unânime pela Quinta Turma do STJ, conforme proposta do relator.
A despeito da jurisprudência firme e sólida do STJ e dos demais tribunais do país de reconhecimento do habeas corpus como instrumento de proteção das garantias individuais, sendo a própria jurisprudência uma dessas garantias, não foi a primeira vez que o ministro Dipp criticou a enxurrada de habeas corpus utilizados como substitutivos de recursos regulares. O que o fez voltar ao tema foi a própria argumentação do impetrante, que recolocou em discussão uma tese que já havia sido apreciada pelo STJ em recurso especial sobre o mesmo caso.
“Chances ampliadas”
“Nunca é demais realçar que o recurso especial tem balizas muito mais rigorosas que o habeas corpus. Enquanto este não está sujeito a prazos e nem, como regra, reclama o prequestionamento, aquele, ao contrário, se sujeita a inúmeros requisitos”, reconheceu o impetrante. Segundo ele, as regras “menos estreitas” do habeas corpus, em comparação com as do recurso especial, “ampliam as chances da defesa”.
Para o relator, o uso do habeas corpus – um instrumento amplo e quase sem limites, reservado a situações excepcionais – não deve generalizar-se com o propósito de “compelir a Corte a apreciar temas que, no recurso especial, porventura não poderia abordar sem as restrições naturais dessa espécie recursal”. O ministro disse que a impetração do habeas corpus em favor de Lucio Ruedas Busto estava cumprindo “obliquamente” uma função que o regime recursal reservou a outros mecanismos legais, “previstos e estruturados racionalmente para alcançar os resultados institucionais”.
Depois de assinalar que o uso legítimo do habeas corpus “em substituição aos recursos cabíveis” tem sido aceito cada vez mais nos tribunais, Gilson Dipp afirmou que não pretendia desmerecer a jurisprudência, mas apenas defendia limites “para que não se perca a razão lógica e sistemática dos recursos por uma irrefletida banalização e vulgarização do habeas corpus”.
“Cabe prestigiar a função constitucional excepcional do habeas corpus, mas sem desmerecer as funções das instâncias regulares de processo e julgamento, sob pena de se desmoralizar o sistema ordinário de julgamento e, forçosamente, deslocar para os tribunais superiores o exame de matérias próprias das instâncias ordinárias”, declarou o ministro.
Segundo ele, “parece imperioso evitar a todo custo que a possível sobreposição de instâncias deliberativas diversas, provocada pelas impetrações sobre mesmo tema, com prejuízo para a respeitabilidade e credibilidade das instâncias ordinárias, venha a se constituir em uso discricionário da jurisdição pelas partes, ao seu gosto e no momento que bem lhes parecer.”
O ministro considerou a ordem impetrada em favor de Lucio Ruedas Busto um exemplo disso, pois o recurso especial, apesar de desdenhado por ter rígidas condições de admissibilidade, constitui, para o STJ, “sua precípua finalidade constitucional de padronização da interpretação do direito federal”. Para Gilson Dipp, “a incessante reiteração de seguidas impetrações, além de imobilizar a jurisprudência da Corte, impede-a de construir seus precedentes com solidez”.
Previsto entre as garantias fundamentais da Constituição, o habeas corpus é usado em defesa da pessoa que sofre ou está ameaçada de sofrer violência ou coação em sua liberdade de ir e vir, por ilegalidade ou abuso de poder. No entanto, segundo o ministro, esse instituto constitucional vem sendo transformado “em remédio para qualquer irresignação, no mais das vezes muito longe de qualquer alegação de violência ou coação contra a liberdade de locomoção”.
Ele sugeriu que, ante a “exuberância de impetrações”, o STJ considere com mais rigor o uso do habeas corpus, por meio da jurisprudência e ao menos no âmbito de sua jurisdição, “de modo a admitir tão só os pedidos cujo tema já tivesse sido objeto de exame pelas instâncias ordinárias, ou quando devida e oportunamente prequestionados”. Na opinião do ministro, “proteger os limites do habeas corpus é fazer respeitar sua credibilidade e funcionalidade”.
Gilson Dipp fez essas considerações ao julgar, como relator, mais um dos inúmeros pedidos de habeas corpus que se avolumam no STJ. Dessa vez, a ordem havia sido impetrada em favor de Lucio Ruedas Busto, ligado ao narcotráfico internacional controlado pelo Cartel de Juarez, do México, e que foi preso e condenado por lavagem de dinheiro e naturalização falsa no Brasil – onde usava o nome de Ernesto Plascencia San Vicente.
Cidadão mexicano, acusado de trazer ao país e aplicar US$ 3 milhões de origem ilícita, o réu foi condenado em Curitiba (PR) e, após apelação, teve a pena fixada em sete anos e seis meses de reclusão pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4). Além de um recurso especial que tramita no STJ, sua defesa impetrou habeas corpus para trancar a ação penal ou anular o processo. O pedido foi rejeitado de forma unânime pela Quinta Turma do STJ, conforme proposta do relator.
A despeito da jurisprudência firme e sólida do STJ e dos demais tribunais do país de reconhecimento do habeas corpus como instrumento de proteção das garantias individuais, sendo a própria jurisprudência uma dessas garantias, não foi a primeira vez que o ministro Dipp criticou a enxurrada de habeas corpus utilizados como substitutivos de recursos regulares. O que o fez voltar ao tema foi a própria argumentação do impetrante, que recolocou em discussão uma tese que já havia sido apreciada pelo STJ em recurso especial sobre o mesmo caso.
“Chances ampliadas”
“Nunca é demais realçar que o recurso especial tem balizas muito mais rigorosas que o habeas corpus. Enquanto este não está sujeito a prazos e nem, como regra, reclama o prequestionamento, aquele, ao contrário, se sujeita a inúmeros requisitos”, reconheceu o impetrante. Segundo ele, as regras “menos estreitas” do habeas corpus, em comparação com as do recurso especial, “ampliam as chances da defesa”.
Para o relator, o uso do habeas corpus – um instrumento amplo e quase sem limites, reservado a situações excepcionais – não deve generalizar-se com o propósito de “compelir a Corte a apreciar temas que, no recurso especial, porventura não poderia abordar sem as restrições naturais dessa espécie recursal”. O ministro disse que a impetração do habeas corpus em favor de Lucio Ruedas Busto estava cumprindo “obliquamente” uma função que o regime recursal reservou a outros mecanismos legais, “previstos e estruturados racionalmente para alcançar os resultados institucionais”.
Depois de assinalar que o uso legítimo do habeas corpus “em substituição aos recursos cabíveis” tem sido aceito cada vez mais nos tribunais, Gilson Dipp afirmou que não pretendia desmerecer a jurisprudência, mas apenas defendia limites “para que não se perca a razão lógica e sistemática dos recursos por uma irrefletida banalização e vulgarização do habeas corpus”.
“Cabe prestigiar a função constitucional excepcional do habeas corpus, mas sem desmerecer as funções das instâncias regulares de processo e julgamento, sob pena de se desmoralizar o sistema ordinário de julgamento e, forçosamente, deslocar para os tribunais superiores o exame de matérias próprias das instâncias ordinárias”, declarou o ministro.
Segundo ele, “parece imperioso evitar a todo custo que a possível sobreposição de instâncias deliberativas diversas, provocada pelas impetrações sobre mesmo tema, com prejuízo para a respeitabilidade e credibilidade das instâncias ordinárias, venha a se constituir em uso discricionário da jurisdição pelas partes, ao seu gosto e no momento que bem lhes parecer.”
O ministro considerou a ordem impetrada em favor de Lucio Ruedas Busto um exemplo disso, pois o recurso especial, apesar de desdenhado por ter rígidas condições de admissibilidade, constitui, para o STJ, “sua precípua finalidade constitucional de padronização da interpretação do direito federal”. Para Gilson Dipp, “a incessante reiteração de seguidas impetrações, além de imobilizar a jurisprudência da Corte, impede-a de construir seus precedentes com solidez”.
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