quinta-feira, 27 de janeiro de 2011

Íntegra da sentença que condenou professora por pedofilia

A sentença do juiz Alberto Salomão Júnior, da 2ª Vara Criminal de Bangu, condenou a professora Cristiane Teixeira Maciel Barreiras a 12 anos de prisão por manter relações sexuais com uma estudante.


Veja a sentença na íntegra:



Cuida-se de AÇÃO PENAL movida pelo MINISTÉRIO PÚBLICO em face de CRISTIANE TEIXEIRA MACIEL BARREIRAS, como incursa nas penas do artigo 217-A (por mais de 20 vezes), n/f do art. 71, ambos do CP; e art. 218-A (vinte vezes), também n/f do art. 71, ambos do CP, tudo n/f do art. 70, in fine do mesmo diploma legal, consoante narra a denúncia de fls. 02a/02d. APF de fls. 2f/05 e RO às fls. 18/25. Auto de apreensão às fls. 26. Laudo de exame de corpo delito (conjunção carnal) às fls. 61/62. Denúncia recebida às fsl. 107. Defesa prévia às fls. 115/117. Laudo de exame de corpo delito (integridade física) às fls. 135. Laudo de exame de corpo delito (ato libidinoso diverso da conjunção carnal) às fls. 136/137. FAC às fls. 140/142. Decisão interlocutória indeferindo o requerimento de habilitação de assistente de acusação às fls. 149. Requerimento de relaxamento de prisão às fls. 153/162, sendo indeferido às fls. 234. AIJ às fls. 245/254, oportunidade em que foi produzida prova oral e juntados documentos aos autos. Alegações finais do Ministério Público às fls. 279/293, requerendo que seja julgada parcialmente procedente a pretensão punitiva estatal, com a conseqüente condenação da acusada nas penas previstas no preceito secundário da norma incriminadora insculpida no art. 217-A (por mais de 20 vezes), n/f do art. 71, ambos do CP; bem como seja a ré absolvida das demais imputações. Decisão interlocutória indeferindo o requerimento de liberdade provisória às fls. 307. Alegações finais defensivas às fls. 308/312, pugnando pela fixação da pena mínima legal. 

É O RELATÓRIO. DECIDO: Imputa-se à acusada a conduta descrita no artigo 217-A (por mais de 20 vezes), n/f do art. 71, ambos do CP; e art. 218-A (vinte vezes), também n/f do art. 71, ambos do CP, tudo n/f do art. 70, in fine do mesmo diploma legal, consoante narra a denúncia de fls. 02ª/02d. Quanto ao delito tipificado no artigo 217-A do CP: Finda a instrução criminal, a materialidade delitiva restou evidenciada pela prova oral produzida nos autos, em especial, no detalhado depoimento da vítima Débora. A autoria delitiva, em que pese a confissão parcial sustentada pela acusada em seu interrogatório, o qual foi documentado através do sistema de recurso de gravação digital audiovisual, no mesmo sentido, ficou demonstrada na pessoa de Cristiane Barreiras (mídia de fls. 277). Frise-se, por oportuno, que a acusada não negou ter vivido um relacionamento íntimo com a ofendida, menor com apenas 13 anos de idade, inclusive, freqüentado com a mesma o Motel Bariloche onde ´namoravam´. Além disso, asseverou ter encontros íntimos no interior do seu automóvel, embora temesse ser vista na via pública em carícias íntimas com a menina, que era sua aluna na Escola Municipal Marechal Rondon. Juliana Pereira dos Santos, ouvida como testemunha, asseverou em juízo que sabia do relacionamento entre a acusada e a ofendida Débora, sua amiga na escola. Afirmou, ainda, que acompanhou ambas nas oportunidades em que foram ao Motel Bariloche e, também, presenciou a acusada beijando Débora no interior do automóvel da mesma. No mesmo sentido e mais detalhado foi o depoimento prestado pela ofendida Débora, que apesar de possuir apenas treze anos de idade, com desenvoltura narrou a prática criminosa levada a cabo pela imputada. 
Na oportunidade em que foi ouvida em juízo a ofendida Débora asseverou que os encontros íntimos ocorriam, principalmente, no Motel Bariloche, às quartas-feiras, embora não se lembrasse por quantas vezes o fato tenha se repetido. Narrou que namoravam também em praças e, em todas as oportunidades, havia beijos na boca e toques libidinosos na vagina e seios.

A vítima Débora, devido à intensidade do relacionamento vivido, chegou a declarar em juízo que sentia grande amor pela acusada e, por tal motivo, pretendia, à época do namoro, com a mesma viver por toda a vida.
A mãe da vítima, Claudia Martins, que foi ouvida em juízo asseverou ter tomado conhecimento do relacionamento íntimo existente entre a acusada e a ofendida Débora. Narrou que a sua filha, inicialmente, admitiu somente a ocorrência de um beijo entre a mesma e a acusada. Depois, passou a ter conhecimento integral dos fatos, porque diligenciou por meios próprios para saber o que realmente havia entre Débora e Cristiane que era professora de sua filha.
As demais testemunhas arroladas pela acusação e ouvidas em juízo prestaram depoimentos que em nada infirmam a imputação. Isto porque, embora não tenha presenciado a prática delitiva imputada, a verdade é que nenhuma pessoa negou a existência da autoria e materialidade delitivas em questão. Neste sentido foram os depoimentos prestados pelos policiais civis que lograram prender a acusada em flagrante delito.
Ressalte-se que a prisão da imputada se deu em flagrante delito, ocasião em que policiais da 33ª Delegacia Policial diligenciavam o paradeiro da vítima Débora que, acompanhada pela acusada, segundo notícia apresentada por sua mãe, encontrava-se fora de casa há dois dias.
A autoria do crime sexual contra pessoa vulnerável descrito na denúncia encontra-se positivada pelas declarações prestadas pelas testemunhas arroladas pela acusação, restando comprovado que efetivamente a acusada satisfez a própria lascívia, praticando com a vítima diversos atos libidinosos, conforme descrito na denúncia. Típica a conduta da acusada, eis que consciente da menoridade da vítima, com esta praticou e a constrangeu, mediante violência presumida, à prática de atos libidinosos diversos da conjunção carnal, quais sejam, beijar a boca da vítima, trocar toques vaginais e nos seios. Evidente o tipo subjetivo na forma dolosa voltada a caracterização do crime contra liberdade sexual apresentando-se com desafogo, no caso, completo à concupiscência. Por oportuno, cabe ressaltar que as testemunhas ouvidas a requerimento da defesa em nada modificam ou abalam a convicção formada pela prova produzida no sentido de prolação de um decreto condenatório.
Basta uma breve análise dos depoimentos prestados para chegar-se a tal conclusão. Não podemos negar que nos delitos clandestinos, isto é, aqueles que ocorrem fora das vistas das testemunhas, dificilmente há uma testemunha direta dos fatos. Por isso, considerando que as referidas testemunhas não viram o fato, a prova oral produzida pela defesa nada acrescentou ao deslinde da causa. Como bem ressaltou o parquet em suas derradeiras linhas, cumpre não esquecer que nos crimes contra os costumes a palavra da vítima assume relevo especial, visto que ocorrem clandestinamente, sendo certo dizer que as declarações da vítima constituem prova de grande importância para alicerçar o decreto condenatório principalmente se tais declarações são plausíveis, coerentes, equilibradas e apoiadas em indícios e circunstâncias recolhidas nos autos. 
Na ocasião do interrogatório, a acusada admitiu a prática do relacionamento íntimo que teve com a vítima Débora. Inclusive, confessou os encontros no Motel Bariloche por três vezes. No que se refere à continuidade delitiva, verifico que todos os requisitos objetivos disciplinados no Código Penal se encontram presentes. De efeito, várias foram as condutas (pluralidade de condutas), sendo praticados vários crimes idênticos (pluralidade de crimes da mesma espécie), todos realizados nas mesmas condições de tempo, com prazos exíguos entre os mesmos (conexão temporal), em bairros contíguos (conexão espacial), além de ser idêntico o modus operandi (mesma maneira de execução), eis que semelhantes a forma e o estilo das infrações perpetradas.

Para o STF, ratificando o que vem sendo defendido pela doutrina majoritária, ´os pressupostos da continuidade delitiva são objetivos. Consideram-se a prática de dois ou mais crimes da mesma espécie e as condições de tempo, lugar, maneira de execução e outras semelhantes.
Descabe potencializar a vida pregressa do agente e o número de delitos por ele cometidos para, a partir da óptica da habitualidade criminosa, afastar a incidência do preceito do artigo 71 do Código Penal. Tanto vulnera a lei aquele que inclui no campo de aplicação hipótese não contemplada como o que exclui caso por ela abrangido.´ (HC 74183/SP - Relator Ministro Marco Aurélio - DJU 21.02.97 - p. 2825). 
A assertiva supra funda-se no fato de que a conduta delituosa ocorreu por várias vezes, sendo certo que não só a ofendida referiu-se a tal fato quando afirmou que teve encontros íntimos com a acusada, como a própria ré, embora tenha negado a prática de atos libidinosos por vinte vezes, admitiu ter se relacionado com a menor no interior do carro, bem como por três vezes no Motel Bariloche.

Dessa forma, incide, in casu, a causa geral de aumento de pena prevista no artigo 71 do Código Penal. Quanto ao delito tipificado no artigo 218-A do CP: Encerrada a instrução criminal, a existência da materialidade delitiva em questão restou duvidosa. No decorrer da instrução criminal, a prova colhida não permite a prolação de um decreto condenatório em desfavor da imputada. Isto porque, a prova oral carreada aos autos é inconclusiva no sentido de que o tipo penal em comento foi violado pela conduta da ré Cristiane Barreiras.
Neste sentido, ressalte-se que tanto a acusada Cristiane Barreiras, quanto Débora Martins e Juliana dos Santos, as adolescentes envolvidas nos fatos, negaram que a última tenha presenciado a prática libidinosa cometida pela acusada com a segunda. As demais testemunhas ouvidas em juízo desconheciam os fatos, portanto, nada acrescentaram ao descobrimento da verdade.
Dessa forma, a prova é duvidosa, sendo certo que nesta fase impera o postulado in dubio pro reo. Portanto, o pleito absolutório dever prevalecer como bem assinalado pelo Parquet em suas derradeiras tintas. A ré é primária e não ostenta maus antecedentes, conforme se extrai da sua FAC de fls. 140/142. Culpável, por último, é a acusada, eis que imputável e estava ciente do respectivo agir, podendo dela ser exigida conduta de acordo com a norma contida no tipo por ela praticado, ausente qualquer causa de exclusão de ilicitude ou culpabilidade.
Pelo fio do exposto, nos exatos termos da fundamentação, julgo parcialmente procedente a pretensão de direito material descrita na denúncia para condenar Cristiane Teixeira Maciel Barreiras, como incursa nas penas do artigo 217-A, n/f do artigo 71, ambos do Código Penal. Absolvo-a da imputação referente ao artigo 218-A do CP, com fundamento no artigo 386, VII do CPP. Da aplicação da pena, consoante o disposto no artigo 68 do CP: Atento às circunstâncias judiciais traçadas pelo artigo 59 do CP, considerando que as mesmas são favoráveis a acusada, pois verifico que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social, a personalidade da agente, os motivos, as circunstâncias e conseqüências do crime, bem como o comportamento da vítima, não autorizam a fixação da pena em patamar superior ao mínimo. Tudo sopesado, fixo a pena-base no mínimo legal, isto é, em pena privativa de liberdade de 08(oito) anos de reclusão. Ausentes circunstâncias atenuantes ou agravantes genéricas, eis que adoto a súmula 231 do STJ. Ausentes causas especiais de diminuição ou aumento de pena. Presente, contudo, causa geral de aumento de pena, exaspero a reprimenda provisoriamente aplicada de metade, por força da continuidade delitiva, n/f do artigo 71 do CP, levando em conta o reiterado e impreciso número de vezes que a conduta delituosa foi cometida, alcançando o patamar de 12 (doze) anos de reclusão, que torno definitiva à míngua de outras moduladoras.
O regime para o cumprimento de pena é o inicialmente fechado. Não poderá apelar em liberdade, porquanto se afiguram presentes os motivos ensejadores da custódia cautelar da ré, ora reforçados pela presente condenação. Ademais, permaneceu presa por toda a instrução criminal e não sobreveio qualquer fato capaz de infirmar a necessidade da manutenção da custódia cautelar da sentenciada.
Condeno, ainda, a ré ao pagamento das custas e da taxa judiciária com fundamento no artigo 804 do CPP. De ressaltar que na fase de cognição não se cogita da isenção do pagamento dos referidas despesas processuais, como já assente na Jurisprudência do Egrégio TJRJ. Procedam-se às anotações de estilo. Transitada em julgado, expeçam-se as demais comunicações de praxe. Publique-se, registre-se e intimem-se pessoalmente o MP e a sentenciada, como de praxe. Intime-se a vítima, na pessoa da sua representante legal.

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